Em Portugal, é altura de deputados da Assembleia da República alterarem a alínea h) do número 3, do artigo 27.º da Constituição, no sentido de passar a ser permitido o internamento obrigatório por motivos de Saúde Pública. Inadiável.

 

São muitos os epidemiologistas que consideram que os vírus existentes na Natureza continuarão a representar, inesperadamente, problemas de Saúde Pública. Por outras palavras, admitem que o Homem não se libertará de múltiplos e sucessivos desafios originados por estas partículas que podem provocar doenças de expressão epidémica. Têm seguramente razão.

 

Assiste-se agora a uma nova crise. A nova epidemia. Preocupante, sem dúvida. Mas ainda mais inquietante seria se cientistas e centros de investigação não estivessem a trabalhar de forma concertada e em harmonia quase perfeita. Assim acontece na China, nos Estados Unidos da América e na Europa.

 

Antes de tudo, há que reconhecer que essa intensa articulação (que também envolve a OMS) explica a rapidez de resultados laboratoriais partilhados entre múltiplos centros de virologia que permitiu, em tempo muito curto, perceber a natureza da doença surgida em Wuhan, na China.

 

Logo se comprovou que o coronavírus é a causa da epidemia. Cedo se decidiu focar o controlo no próprio epicentro da atividade epidémica. A expressão inglesa fight at the source traduz essa medida básica que visa reduzir a propagação de novos casos da doença.

 

Foram, então, concebidos e desenvolvidos procedimentos, aliás, raramente aplicados, aparentemente inovadores, como o cordão sanitário e a quarentena. Métodos de controlo que eram há muito conhecidos dos historiadores que descreveram esses processos em surtos como a Peste Medieval na Europa ou, mais tarde, em 1899, durante o isolamento da cidade do Porto proposto por Ricardo Jorge. Medidas quase sempre impopulares, mas que parecem confirmar a sua eficácia ao reduzirem consideravelmente a probabilidade de exportação da epidemia (50% a 75%?). A perspetiva é impedir o crescimento descontrolado da magnitude do problema e, portanto, a sua extensão pandémica (isto é, a propagação simultânea pluricontinental).

 

As doenças provocadas pelos coronavírus são, em regra, zoonoses (doenças comuns a animais e seres humanos), conhecidas desde há mais de 50 anos. Sabia-se que o vírus circulava em diversas classes, ordens e espécies animais sob a forma de epizootias, mas que também provocava doenças em seres humanos como infeções respiratórias ligeiras, por exemplo. Em 2002 esteve na origem de uma epidemia SARS (Síndrome Aguda Respiratória) que foi consequência do salto da barreira de espécie que envolveu o gato-almiscarado. Dez anos depois surge, também sob a forma de pneumonia atípica, no Médio Oriente, associado a camelos. Atualmente, tudo indica, a crise terá o morcego como reservatório e outros animais como hospedeiros que transmitem o coronavírus a seres humanos que formam, por sua vez, cadeias de transmissão.

 

Justamente, formulam-se as seguintes questões: como interromper a transmissão zoonótica e inter-humana? Como controlar a epidemia? Como prevenir? O que pensar? O que fazer? Para onde vamos? Mas antes das respostas realça-se que, até ao momento, não se conhece a parte do iceberg ainda submersa, mas é apropriado colocar essas questões.

 

É oportuno planear respostas a situações ainda mais graves. Mobilizar mais recursos. Vigiar. Monitorizar a curva epidémica. Registar os casos acumulados e os óbitos ocorridos entre os doentes. Estimar a taxa de ataque e a probabilidade de cada doente transmitir a doença.

 

É muito possível. É muito provável. É quase certo que as respostas às questões suscitadas sejam baseadas na preparação de uma vacina, uma vez que o vírus está identificado e que se conhece a sua estrutura molecular. É desejável que, muito em breve, esteja disponível para prevenir e controlar a epidemia, atendendo à emergência em Saúde Pública a nível global.

 

Em Portugal, é altura de deputados da Assembleia da República alterarem a alínea h) do número 3, do artigo 27.º da Constituição, no sentido de passar a ser permitido o internamento obrigatório por motivos de Saúde Pública. Inadiável.

 

Agora, importa promover a transparência e a flexibilidade. Comunicar, informar, esclarecer, confiar e dar tempo ao tempo.

 

Presidente Nacional da Cruz Vermelha Portuguesa

 

Francisco George 

 

In “Público”