Governo quer diminuir ainda mais a quantidade de açúcar nas saquetas que as pessoas usam no café, chá ou outras bebidas.
Quatro gramas é o limite pretendido mas, para já, apenas vai avançar nas cafetarias e restaurantes das grandes superfícies.
Grama a grama, gradualmente, vai-se reduzindo o açúcar nos pacotes individuais em Portugal, sem que o consumidor se aperceba. Esta estratégia que arrancou há dois anos com a diminuição da quantidade de açúcar nos pacotinhos usados nos cafés e restaurantes (de oito gramas para um máximo de cinco ou seis) vai ser alargada agora através de um protocolo que é assinado esta quinta-feira com as empresas de distribuição. Nos bares, cafetarias e restaurantes das grandes superfícies, a quantidade máxima de açúcar nas saquetas passará dos actuais oito gramas para apenas quatro, até ao final de 2019.
Mas uma nova redução do volume de açúcar dos pacotes individuais usados nos cafés e nos restaurantes já se perspectiva para breve. No relatório Alimentação Saudável - Desafios e Estratégias 2017/2018 que acaba de ser divulgado no site da Direcção-Geral da Saúde (DGS), está prevista "a revisão do protocolo celebrado com os industriais do café para a redução do volume dos pacotes de açúcar para um máximo de quatro gramas".
Pedro Graça, director do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável, da DGS, admite que é ambição dos responsáveis que haja um "alinhamento" e que os quatro gramas de açúcar passem a ser o limite em todos os sectores. Mas não há, por enquanto, uma data prevista para esta revisão, precisa.
Quanto ao acordo assinado com a Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição (APED), o compromisso é válido por três anos e implica que estas deixem de produzir doses individuais de açúcar que excedam os quatro gramas. Apesar de poder avançar desde já, as empresas têm até 31 de Dezembro de 2019 para concretizar esta redução, explica o Ministério da Saúde em nota.
A APED esclarece que "as medidas e ajustes necessários serão feitos progressivamente e de acordo com a estratégia de cada insígnia, até à data limite" e que, até essa altura, serão escoados os produtos e embalagens já existentes. Os pacotes individuais são comercializados nas lojas e disponibilizados nos espaços de cafetaria e restauração das empresas.
Este protocolo vem "reforçar e aprofundar um caminho iniciado há dois anos e que torna agora as metas mais ambiciosas, no âmbito da Estratégia Integrada para a Promoção da Alimentação Saudável (EIPAS)", recorda o Ministério da Saúde. Em 2016, o acordo com as associações representativas da indústria alimentar implicou a redução do volume das doses individuais de açúcar de um máximo de oito gramas para um limite de cinco a seis gramas.
A alimentação saudável também é uma questão política
"Não se trata de limitar a liberdade e os direitos das pessoas", garante Pedro Graça, até porque, frisa, é sempre possível pedir outro pacotinho. Além disso, há muitas pessoas que não usam as saquetas na totalidade, e, desta forma, vão para o lixo milhares de quilogramas de açúcar, transformando um problema que começa por ser de saúde pública num problema também de ambiente e de desperdício.
"É uma medida que se reveste de um simbolismo importante", reforça a bastonária da Ordem dos Nutricionistas, Alexandra Bento, que nota que "a tendência actual é a de se ir reduzindo as porções" de tudo o que é nocivo para a saúde. "Este é o caminho. As pessoas se calhar não se lembram, mas ainda há poucos anos os pacotinhos tinham dez gramas de açúcar e passaram para oito e depois para cinco e por aí em diante”, enumera a bastonária, para quem não há necessidade, sequer, de usar açúcar no café ou no chá. "É uma questão de habituação", defende.
Sublinhando que os hábitos alimentares são o factor de risco que mais contribui para o total de anos de vida saudável perdidos pela população, o Ministério da Saúde recorda que esta medida se insere numa estratégia global que passa pela alteração da disponibilidade dos produtos à venda, pela reformulação dos produtos alimentares (além da redução de açúcar, da diminuição do sal e das gorduras trans) até 2020.
A desnutrição hospitalar é outro dos problema elencados no documento agora divulgado pela DGS, que remete para um despacho publicado no início deste mês, o qual prevê que, a partir do próximo ano, o risco nutricional dos doentes internados nos hospitais públicos por um período superior a 24 horas passe a ser sempre avaliado.
Era uma reivindicação antiga e uma necessidade premente, uma vez que a prevalência de desnutrição em doentes internados em hospitais apresenta valores, dependendo dos critérios de avaliação e definição, que "variam entre os 20 e os 50%", refere o despacho assinado pelo secretário de Estado adjunto e da Saúde, Fernando Araújo.
"Esta é uma medida de extrema importância", considera a bastonária da ordem dos Nutricionistas. Apesar de a avaliação do risco nutricional já ser efectuada nalguns hospitais públicos, "não o era de forma sistemática e em todos os doentes internados", diz. Finalmente, comenta a especialista em nutrição, a professora Conceição Calhau, que sublinha que há países que já consideram que é "negligência" não fazer este tipo de avaliação.
A desnutrição adquirida durante o tempo de internamento está associada a um aumento do tempo de internamento e ainda ao aumento do risco de infecções e outra complicações, justifica-se no despacho. As ferramentas de identificação do risco nutricional serão operacionalizadas por uma equipa multidisciplinar e deverá ser assegurado que os serviços de acção médica dos hospitais públicos sejam dotados de equipamento necessário, como balanças, estadiómetros e fitas métricas, até ao primeiro trimestre do próximo ano.
Luz verde para contratar 40 nutricionistas
A identificação do risco nutricional deve ser feita durante as primeiras 24 horas após a admissão hospitalar do doente e deve ser repetida semanalmente durante o internamento. Se o paciente estiver em risco, deve ser sinalizado para o serviço de nutrição hospitalar, que avaliará o estado nutricional do doente e estabelecerá o diagnóstico.
Para poder levar a cabo esta tarefa, os hospitais vão ter que assegurar a formação e capacitação dos profissionais de saúde envolvidos. E será necessário contratar mais nutricionistas, uma vez que, noutro despacho publicado também no início deste mês, se instituiu a obrigatoriedade de haver núcleos ou unidades de nutrição nos agrupamentos de centros de saúde e serviços de nutrição nos hospitais públicos.
Notando que em todas as unidades do Serviço Nacional de Saúde (SNS) há apenas cerca de 400 nutricionistas, Alexandra Bento diz que depois de, no ano passado, o Ministério das Finanças não ter dado luz verde à contratação de 55 profissionais para os centros de saúde, este ano já autorizou o concurso público que vai permitir a entrada de 40. O concurso deve ser aberto em breve e os profissionais irão juntar-se aos pouco mais de 100 nutricionistas que actualmente trabalham nos cuidados de saúde primários.
ALEXANDRA CAMPOS
In “Público”