O chamado "exercício intervalado de alta intensidade" (em inglês: "high-intensity interval training" ou HIIT) desperta hoje a atenção de investigadores, profissionais de exercício físico e autoridades de saúde. Aqui analisamos as suas características e potenciais benefícios, à luz da evidência científica.
Recentemente, os resultados do Eurobarómetro mostraram que a grande maioria dos europeus não são suficientemente ativos, indicando a falta de tempo livre e a falta de interesse como razões principais. Neste sentido, é mais atual do que nunca encontrar estratégias para promover a adesão a programas de atividade física e exercício, tornando-os mais agradáveis e apetecíveis, assim como aumentar a eficiência temporal dos mesmos, tentando torná-los mais curtos.
É sabido que as adaptações do corpo humano ao exercício físico são mediadas pelas características do treino, como a sua duração, frequência, intensidade e também a forma — por exemplo, contínua ou intervalada — como os exercícios são aplicados. Ao contrário do treino contínuo, onde os exercícios são prolongados no tempo e caracterizados por intensidade ligeira a moderada, o exercício intervalado desenha-se através da repetição de períodos de exercício de intensidade vigorosa, intercalados com períodos de recuperação ativa ou passiva. O princípio subjacente ao exercício intervalado é que uma maior quantidade de trabalho físico e a realização de intensidades mais elevadas durante uma única sessão de treino potencia a carga fisiológica imposta ao organismo e também a respetiva adaptação.
Vários estudos têm vindo a demonstrar que o treino intervalado de alta intensidade pode ter maiores benefícios para a saúde comparativamente ao treino contínuo, seja em pessoas saudáveis, seja em indivíduos com doenças cardiometabólicas. Por exemplo, o consumo máximo de oxigénio aumenta de forma mais rápida e notória, havendo uma redução dos fatores de risco associados à síndrome metabólica, incluindo a pressão arterial e a sensibilidade à insulina. O treino intervalado de alta intensidade parece assim ser uma estratégia eficiente, permitindo com um menor tempo de treino obter iguais ou até melhores resultados, em termos de funcionalidade e de benefícios para a saúde. Possibilita ainda atenuar a barreira da falta de tempo livre para a atividade física. O potencial enquanto programa de exercício físico parece manifestar-se de tal forma que, atualmente, muitas das opções de exercício mais populares (como o designado crossfit) se baseiam genericamente nestes princípios.
Não obstante a crença de que exercícios com intensidade elevada são demasiado cansativos e desagradáveis, tal não é necessariamente verdade. A investigação mostra-nos que o prazer/desprazer no exercício está significativamente relacionado com o facto de a escolha da intensidade ter sido feita pelo próprio utente/cliente (ou ter concordado com ela) ou imposta sem o seu envolvimento. No primeiro caso, o desafio de a pessoa se exercitar a intensidades mais elevadas permite manter e até aumentar a sua motivação.
Num programa de treino intervalado de alta intensidade, a intensidade dos exercícios deve ser calculada individualmente em função da aptidão cardiorrespiratória e respetivos indicadores de frequência cardíaca ou, em alternativa, através do recurso à perceção subjetiva de esforço (considerando um esforço entre “difícil” e “muito difícil”). Como esta última aproximação é subjetiva, utiliza-se frequentemente o “teste de fala” como guia, sendo a intensidade vigorosa aquela onde se revela difícil manter a conversação. Os intervalos de recuperação devem ser confortáveis e servir exatamente esse efeito, isto é, para recuperar e preparar o sujeito para o próximo exercício, podendo ser passivos ou, preferencialmente, realizados com exercício de intensidade ligeira.
A relação entre tempo de exercício e intervalo de recuperação é também importante. Habitualmente opta-se por uma proporção de 1:1, com iguais tempos de exercício e recuperação. Por exemplo, se o exercício durar 4 minutos, também a recuperação em repouso ou em esforço de baixa intensidade deverá ser de 4 minutos. Normalmente, nestes programas de 1:1 o tempo de exercício varia entre os 3 e os 5 minutos, seguidos por igual tempo de recuperação. Esta combinação de exercícios/recuperação pode ser repetida entre 3 a 5 vezes por cada sessão de treino.
Não obstante os seus benefícios, a realização deste tipo de treino por indivíduos sedentários ou fisicamente descondicionados tem um risco acrescido de ocorrência de complicações cardiovasculares, osteoarticulares e/ou músculo-tendinosas. Quanto mais intenso for o exercício, maior o risco de complicações cardiovasculares, agravado pela idade e pela existência de hipertensão, diabetes/pré-diabetes, dislipidemia, obesidade e hábitos tabágicos. Para reduzir este risco, é aconselhável que se desenvolva, antes de iniciar o programa de treino, um nível mínimo de aptidão física, quer em termos cardiorrespiratórios, quer em termos de força muscular. Assim, antes de iniciar este tipo de prática, é recomendado que os indivíduos tenham já uma história de várias semanas de treino aeróbico consistente (3 a 5 sessões por semana, durante 20 a 60 minutos por sessão, com intensidade moderada) assim como de treino de força muscular.
Sendo os exercícios do treino intervalado de alta intensidade mais exigentes e exaustivos que os exercícios do treino prolongado, torna-se também necessário um período de recuperação mais prolongado entre as sessões de treino. Assim, no início, recomenda-se apenas uma sessão de treino intervalado de alta intensidade por semana. Com a progressiva melhoria da aptidão física, o número de treinos por semana pode aumentar para dois ou três, suficientemente espaçados entre si.
Considerando as suas características e benefícios, se o HIIT for prescrito e acompanhado em condições rigorosas e por profissionais de exercício físico devidamente habilitados, representa uma opção válida e segura para pessoas que desejam aumentar o seu nível de atividade física e melhorar a sua saúde.
In “Público”