Estudo foi feito pelo Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge. “As mulheres não aderem mais cedo porque muitas vezes não planeiam a gravidez. Em vez de serem proactivas são reactivas", diz coordenadora do Registo Nacional de Anomalias Congénitas.

A percentagem de mulheres que toma ácido fólico antes da gravidez está a aumentar mas ainda está longe de ser a ideal. A maior parte toma este suplemento durante o primeiro trimestre de gravidez, mas apenas 45% começam a fazê-lo antes de engravidar, precisamente a fase em que esta medida de prevenção de anomalias congénitas faz mais sentido. 

São resultados de um estudo preliminar do Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge que incluiu 446 grávidas em seguimento na rede médicos-sentinela (médicos de família que fazem notificações voluntárias de doenças) entre Janeiro e Outubro de 2017. 

No conjunto das mulheres estudadas, 95,5% tinham tomado ácido fólico (uma vitamina do grupo B) no primeiro trimestre de gravidez, mas apenas 45,2% iniciaram a toma antes da gravidez. Um resultado que põe em causa a redução da prevalência de anomalias congénitas genericamente designadas como “defeitos do tubo neural”, uma vez que o encerramento do tubo neural acontece antes do final do primeiro mês de vida do embrião. 

O ideal, explica Paula Braz, coordenadora do Registo Nacional de Anomalias Congénitas do instituto e autora deste estudo, em conjunto com mais três especialistas, é que as mulheres planeiem a gravidez e comecem a tomar o suplemento algum tempo antes de suspender o método contraceptivo utilizado. “Iniciar a toma de ácido fólico dois meses antes da gravidez é bastante bom.” 

Quando toma este composto químico antes de engravidar, especifica a especialista em saúde pública, a mulher está a reduzir “entre 70% a 80% o risco” de a sua criança ter defeitos do tubo neural, um conjunto de anomalias congénitas que incluem a anencefalia (ausência total ou parcial do encéfalo e da caixa craniana) ou a espinha bífida (falha no desenvolvimento da coluna vertebral). Problemas que ocorrem até ao 28.º dia de vida fetal, período em que muitas mulheres ainda não sabem que estão grávidas. 

Após a gravidez, sublinha Paula Braz, a redução deste risco é muito baixa ou quase inexistente. Ainda assim, recomenda-se que as mulheres tomem este suplemento durante o primeiro trimestre. O problema, nota a especialista, é que há sempre franjas da população a quem esta informação não chega, habitualmente mulheres com menos literacia e menor acesso a cuidados de saúde. 

A boa notícia é que, apesar de a adesão ainda estar bem longe de ser a ideal, observou-se uma melhoria face a estudos anteriores. Em 2005, dados da rede de médicos sentinela indicavam que apenas 18,7% das grávidas tinham iniciado a toma de ácido fólico antes da gravidez e só 8% o tinham feito de acordo com as recomendações em vigor. 

Um outro trabalho, elaborado com dados do Registo Nacional de Anomalias Congénitas e divulgado em 2015, indicava uma prevalência de defeitos do tubo neural sem significativa alteração entre 2004 e 2013 e uma adesão à suplementação antes da gravidez de apenas cerca de 10% das grávidas. 

Este é precisamente “o calcanhar de Aquiles”, sublinha Paula Braz. “As mulheres não aderem mais cedo porque muitas vezes não planeiam a gravidez. Em vez de serem proactivas são reactivas.” Os resultados coincidem, aliás, com os de estudos que avaliaram a frequência de mulheres que planeiam a gravidez e efectuam consultas pré-concepcionais.

Relativamente à quantidade tomada, em mais de 90% das mulheres estudadas em 2017 o medicamento consumido continha 5 miligramas de ácido fólico, uma dosagem superior à sugerida na literatura. A quantidade recomendada em vários países varia entre 400 a 800 microgramas por dia, com os medicamentos de 5 miligramas a ficarem reservados para as mulheres que já tiverem filhos com este tipo de anomalias. 

O estudo vai prosseguir ao longo deste ano, para se obter uma amostra que permita “uma análise mais robusta das características sócio-demográficas das mulheres”. Os defeitos do tubo neural têm uma frequência inferior a um caso por cada dois mil nascimentos em Portugal.

 

ALEXANDRA CAMPOS 

In “Público”