A Sociedade Portuguesa de Hipertensão criada há apenas 13 anos, conta já nesta sua curta existência com conquistas importantes na luta contra o risco cardiovascular global em geral e contra a Hipertensão Arterial em particular.

Sendo um facto sobejamente conhecido, nunca é demais lembrar que foi sob a nossa égide que se conseguiu fazer aprovar a Lei do Sal no Pão (2008).

 

Citada por inúmeras vezes pela comunidade científica internacional como pioneira em todo o mundo, se outros méritos não teve, teve por si só o mérito e o condão de demonstrar que é possível fazer bem sem alimentar mal.

 

Já em 2013 foi publicado no Journal of Hypertension o estudo Physa, que actualizando os valores da prevalência, do tratamento e do controlo da Hipertensão que eram conhecidos do estudo PAP de 2003 e, permitiu simultaneamente perceber que, embora continuemos a consumir elevado teor de sal diário, este desceu em 10 anos um pouco mais de 10%.

 

Mas, se fizemos muito e bem, então porque é que a doença cardiovascular, com o Acidente Vascular Cerebral e a Hipertensão à cabeça, continua a matar 1 em cada 3 portugueses?

 

Há que assumir que este caminho que já deu e, certamente continuará a dar, bons frutos, não é, por si só, suficiente para melhorarmos este negro panorama nacional.

 

É por isso que esta Direcção se propôs iniciar uma caminhada, também ela pioneira e, também ela na crista da onda do pensamento científico pelos melhores experts na matéria, de promover uma consciencialização a todos os níveis para uma maior e melhor adesão ao tratamento.

 

Um medicamento só pode fazer efeito se for tomado! Simples!

 

Olhemos para alguns dados que nos devem deixar a pensar:

 

– Um estudo recente nos Estados Unidos revelou que entre 20 a 30% das receitas nunca chegam a ser levantadas.

 

– Cerca de 1 em cada 2 doentes não toma a medicação conforme lhe foi prescrita

 

– O custo anual pela não adesão ao tratamento estima-se, nos Estados Unidos, entre 100 e 289 biliões de dólares (entre um pouco de 91 mil milhões e 300 mil milhões de euros)!

 

Os Países ricos já perceberam que têm de arrepiar caminho.

 

É, pois, altura de nós, que tanto nos queixamos de não termos dinheiro, fazermos o mesmo.

 

Esse lema desta Direcção de adesão ao tratamento tem de ser levado a sério por quem de direito.

 

Não é mais possível continuar a fingir que o problema não existe e, que a nossa luta é a de uns bons rapazes bem-intencionados.

 

E, porque não nos limitamos a falar, no passado mês de Abril do ano transacto, levámos a cabo a realização de um Simpósio Satélite ao Congresso Europeu de Hipertensão deste ano, que contou com a presença de reconhecidos nomes de craveira nacional e internacional e, onde foi conseguido um elevadíssimo nível científico que muito nos orgulhou e que por todos, sem excepção, foi reconhecido e enaltecido, ao ponto da Sociedade Húngara de Hipertensão ter já decidido replicar no próximo ano o mesmo tema.

 

Mas, porque nunca estamos satisfeitos, mesmo quando as iniciativas superam as nossas expectativas, no último Novembro levámos a cabo em Lisboa a realização do 1º Encontro dos Pequenos Países Europeus.

 

Tratou-se de uma iniciativa, onde os jovens investigadores de cada um dos Países participantes, a saber, Áustria, Bélgica, Holanda, Hungria, Suíça e Portugal, puderam apresentar os seus trabalhos, sem a pressão dos grandes eventos, nem a crítica, tanta vez fácil e desproporcionada.

 

A oportunidade permitiu também que discutíssemos problemas conjuntos, a necessidade de ter uma voz conjunta e mais activa junto da ESH.

 

Uma vez mais, a iniciativa mereceu o aplauso dos nossos convidados, pelo que ficou desde já agendada uma reunião anual destes mesmos Países, pelo menos, até 2021.

 

Mais do que credibilizar e prestigiar a Sociedade Portuguesa de Hipertensão, estas foram formas de credibilizar e prestigiar a comunidade científica de Portugal.

 

Quem lá esteve e, não foram tão poucos como isso, percebeu que, se na sua prática clínica, a preocupação com a adesão ao tratamento por parte do doente ainda não era uma primeira prioridade, a mudança na sua consciencialização para essa necessidade e, a consequente mudança no acto clínico, teria de passar a ser uma realidade.

 

É perceber que esta é uma forma actual e pioneira de tratar o doente.

 

É por isso que dizemos, que do ponto de vista da classe médica, é necessário que se perceba que se queremos e, por isso devemos pugnar, que os nossos doentes aumentem substantivamente a adesão ao tratamento, temos o dever e a obrigação de proporcionar fármacos, que para além de eficazes, sejam simples e práticos de tomar.

 

A multiplicidade de tomas e de comprimidos será sempre um entrave à adesão.

 

No contexto do doente há que conseguir motivá-lo e alertá-lo para esta mesma necessidade de adesão ao tratamento.

 

O tratamento de doenças crónicas, de que a hipertensão é um bom exemplo, não é para um dia, é para uma vida!

 

Sabemos e, disso estamos conscientes, que a redução do risco cardiovascular global dificilmente, ou pelo menos em apenas numa pequena minoria, se consegue com exclusivamente medidas não farmacológicas, sem que isto signifique, bem pelo contrário, que estas não sejam necessárias, como é o caso da redução do sal ou de uma prática regular de actividade física.

 

Sabemos e, disso estamos conscientes, que a redução do risco cardiovascular global dificilmente, ou pelo menos em apenas numa pequena minoria, se consegue com uma só substância activa.

 

Sabemos e, disso estamos conscientes, que o tratamento do risco cardiovascular global é preconizado nas Guidelines com duas ou mais substâncias activas e, de preferência, em associações fixas.

A pergunta que logo daqui surge é a de que se, então sabemos e, disso estamos conscientes, que a redução e o tratamento do risco cardiovascular global apenas se consegue da forma acima explicitada, porque é que não colocamos em prática tais conceitos?

 

Muitas explicações podem ser dadas, muitas hipóteses podem ser aventadas.

 

Talvez a ideia de que tal abordagem é cara seja uma delas.

 

Pois quanto errados estamos!

 

Uma vez mais, estão-se a esquecer duas realidades:

 

– Uma primeira tem a ver que a médio prazo – e não é preciso ser assim tão a médio prazo – os custos com hospitalizações, baixas ao trabalho e incapacidades permanentes são bem mais caras.

 

– Uma segunda e, bem mais importante, nada é mais caro do que a morte!

 

Estou certo, estamos certos, que este é um caminho longo e difícil.

 

Estou certo, estamos certos, que abdicar desta luta por uma maior e melhor adesão ao tratamento é abdicar de tratar, controlar e melhorar o risco cardiovascular global, é, numa palavra, abdicar de melhorar a saúde dos portugueses.

 

E isso, nós não o vamos fazer! Para isso não contem connosco!

 

Não vamos esquecer quem nos quiser ajudar nesta caminhada. Porque, como sempre disse e, direi:

 

Quem não tem memória, não tem futuro

 

Manuel de Carvalho Rodrigues

 

Cardiologista do CHCB – Hospital Pêro da Covilhã

 

Docente da FCS – Universidade da Beira Interior

 

Presidente da Sociedade Portuguesa de Hipertensão

 

 

 

In “Saúde Online