A obesidade é um problema de toda a sociedade, da forma como vive, trabalha, se alimenta e descansa.
A obesidade é considerada uma doença mas também é um fator de risco significativo para a doença cardiovascular, a diabetes tipo 2, o cancro, a apneia do sono e assim, de forma direta ou indirecta, diminui a qualidade de vida e reduz a esperança de vida das pessoas que vivem com obesidade.
É uma doença complexa pois os mecanismos pelos quais uma pessoa se torna obesa são muitos, distintos e implicando intervenção em vários sistemas orgânicos. Há uma genética da obesidade, há factores ao nível do sistema nervoso central e cérebro responsáveis pela saciedade e recompensa alimentar, há hormonas e ligações de aminoácidos, no tubo digestivo e pâncreas muito importantes na regulação do peso, há disruptores endócrinos e químicos presentes em quase tudo o que nos rodeia e na alimentação...
No entanto como factores principais na grande maioria das pessoas que nas últimas décadas se tornaram obesas e colocaram a obesidade como uma epidemia mundial está, sem qualquer dúvida, o excesso alimentar e a redução da actividade física. Quando referimos excesso alimentar estamos a querer referir não só a ingestão de uma quantidade excessiva de comida, mas também uma alimentação muito rica em gordura e açúcar que lhe confere um grande valor calórico. A menor actividade física diária, quando comparada com décadas anteriores, é generalizada a toda a população e vai sendo apenas parcialmente compensada com a actividade física de recreio.
É a obesidade um problema essencialmente médico? Não, é um problema de toda a sociedade, da forma como vive, como trabalha, como se alimenta e como descansa. Antes do tratamento há a prevenção da obesidade. Na prevenção toda a comunidade tem de intervir: os poderes públicos, as famílias, a indústria alimentar, as organizações profissionais, os médicos, os nutricionistas, etc. Aos médicos cabe principalmente tratar as consequências, ou seja, as doenças provocadas pelo peso a mais. Cabe também aconselhar como prevenir o excesso de peso mas já em colaboração com as famílias e, no caso dos jovens em idade escolar, com as escolas. Tem sido tradicional que os médicos façam e têm sido feitos alertas aos poderes públicos e à indústria alimentar no sentido de, em conjunto, apresentarem soluções que possam melhorar este importante aspeto da saúde pública.
A indústria alimentar deve ser chamada a colaborar neste objectivo de redução da população obesa. Será muito difícil uma intervenção positiva sem a sua colaboração. Pede-se a produção e promoção de alimentos com menor densidade calórica, menos gorduras, menos sal e açúcar. A grande capacidade de marketing que possui e diariamente demonstra deve também ser posta ao serviço deste objectivo.
Quais os indicadores de Portugal relativamente ao excesso de peso e obesidade? Infelizmente não são bons. Mais de metade da população portuguesa, mais precisamente 52,8%, tem peso a mais, o que significa um aumento percentual de dois pontos percentuais em oito anos. Há 3,1 milhões de pessoas com excesso de peso e 1,4 milhões com obesidade. Na população adulta, o aumento do excesso de peso e obesidade é maior nas pessoas com idade entre os 45 e os 75 anos. Relativamente ao sexo, a percentagem de mulheres obesas é ligeiramente superior aos homens. Na população mais jovem com menos de 20 anos a obesidade aumentou de 3% para 8% em 25 anos.
Nos hábitos alimentares inadequados em Portugal devemos referir também a baixa adesão à dieta mediterrânica, o consumo reduzido de hortofrutícolas e o consumo elevado de refrigerantes e sal. Cerca de 15,8% de anos perdidos de vida saudável são devidos a maus hábitos alimentares.
Há novos fármacos capazes de facilitarem o tratamento da obesidade e que permitem a perda de peso, que podem ter um impacto positivo na qualidade de vida do doente com obesidade, desde que integrados num plano geral de tratamento que inclui regime alimentar e actividade física adequados.
FRANCISCO CARRILHO
Director do Serviço de Endocrinologia e Diabetes do CHUC-Coimbra; presidente da Sociedade de Endocrinologia e Diabetes
OPINIÃO
In “Público”