Considero que a prática dos enfermeiros está intimamente relacionada com as transições e em muitos casos somos nós que mais nos envolvemos e acompanhamos todo o processo, de avaliação, de planeamento e de intervenções que cada situação o exige.
Segundo Harison (2004) “o contributo da enfermagem é crucial para o sucesso da transição”. Na realidade de todos os profissionais de saúde o enfermeiro assume um papel privilegiado e único nos processos desenvolvimentais, nos eventos vitais da pessoa ao longo do seu continuum de vida. Ao desenvolvermos um contacto próximo com o doente e família permite-nos a possibilidade de um primeiro contacto com as suas inquietações/ vulnerabilidades e necessidades.
Os enfermeiros de saúde mental e psiquiatria possuem na realidade ferramentas fundamentais que permitem ajudar o doente e seus familiares na transição saúde/doença e a tudo o que a ela esteja implicado. Fixamo-nos no hospital de dia de hemato-oncologia num enfoque de intervenção construtivo, que permite-nos mais facilmente compreender a pessoa humana muito para além do sofrimento, no desenvolvimento das suas potencialidades e recursos próprios. A ansiedade apresenta-se como um dos sintomas emocionais que mais está presente no nosso doente e família, trabalhamo-la tendo o cuidado de não os libertar completamente desta, porque na realidade sabemos que precisam desenvolver a capacidade de tolerar uma ansiedade leve e usá-la consciente e construtivamente para o seu fortalecimento, adaptação e integração.
Promovemos nas nossas intervenções em hospital de dia hemato-oncologia um clima de confiança, de competência, disponibilidade, compreensão/empatia e atenção, atendendo á confidencialidade, tratam-se de sofrimentos particulares e únicos. Encorajamos com o ensino das nossas técnicas de motivação e comunicação, há expressão de sentimentos, percepções e medos, ajudando a pessoa doente e família a dominar os seus receios e as suas dúvidas, promovendo assim a sua independência e processo adaptativo. Ajudamos a descobrir e a desenvolver mecanismos de luta estruturantes, a resiliência, a capacidade de enfrentamento, o empoderamento. Ajudamos na reinterpretação das situações de uma forma mais positiva, fazendo-lhes ver que o que aconteceu se tratou de uma sequência de eventos que simplesmente aconteceram. Exploramos com a pessoa doente e família stressores relevantes e delineamos conjuntamente estratégias de coping, que são na realidade o que o doente e família possui para gerir os acontecimentos transitórios das suas vidas ao longo da sua existência. Investimos nas estratégias de coping porque acabam por funcionar como mediadores no processo de recuperação do doente, levam na realidade a uma maior implicação do doente nos seus tratamentos, inevitáveis e necessários, permitindo que a sua recuperação seja mais eficaz. Saliento que o trabalho na área de oncologia é tão gratificante como desgastante, porque criamos laços com a pessoa doente e seus familiares e temos de aprender muitas vezes a gerir emoções, os estados de espírito, os nossos inclusive, para que também possamos permanecer equilibrados. Contrariamente o que a maioria das pessoas imaginam o ambiente no hospital de dia hemato-oncologia não é obrigatoriamente “pesado”. Na maior parte do tempo a boa disposição está presente, rimos e brincamos porque é uma boa maneira de manter todas as pessoas motivadas, facilitando a expressão de sentimentos e emoções também com os nossos abraços, aliviando a ansiedade facilitando a gestão das situações vividas no momento por todos.
FÁTIMA FREITAS
Enfermeira Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica
In “Jornal da Madeira”