Inquérito diz que mulheres ainda associam este cancro a elevada mortalidade e a factores hereditários. Mas a predisposição genética só explica 10% a 15% dos casos. Das inquiridas, 72% já fizeram mamografia.
Mais do que os acidentes vasculares cerebrais ou do que doenças degenerativas como o Alzheimer, o cancro ainda é a doença que mais preocupa as portuguesas. Dentro das doenças oncológicas, as mulheres elegem o cancro da mama como aquele que mais temem, seguindo-se os tumores do cólon e do recto.
Os dados fazem parte de um novo estudo sobre a percepção que as mulheres têm do cancro da mama, que mostra que a hereditariedade e a mortalidade ainda são dois dos factores que as inquiridas mais associam à doença.
O trabalho, feito pela empresa de estudos de mercado GFK, a pedido da farmacêutica Roche, indica que, para 70% das mulheres que participaram no estudo, o cancro é a doença que merece mais preocupação. Em segundo lugar, e apenas com 5% das respostas, surge o Alzheimer e os acidentes vasculares cerebrais.
Entre os vários tipos de tumores malignos, seis em cada dez mulheres elegem o da mama como o que gera mais receio, atribuindo este medo aos antecedentes familiares (referidos por 27% das pessoas) e à elevada mortalidade (22%). O estudo contou com um total de 600 mulheres com mais de 18 anos e que nunca tiveram nenhum diagnóstico de cancro da mama. As entrevistas foram feitas por telefone a uma amostra representativa da população nacional em Fevereiro deste ano.
O oncologista Paulo Cortes, em declarações ao PÚBLICO a propósito dos resultados, lembra que há agora “muito boas perspectivas de sobrevivência” após um diagnóstico de cancro da mama. “Evoluímos muito e conseguimos diagnosticar o cancro em fases mais precoces e temos um número maior de curas. O segredo é mesmo o diagnóstico precoce”, defende o especialista, que coordena a Unidade de Oncologia do Hospital Lusíadas. “A maioria dos casos são diagnosticados em fases precoces e potencialmente curáveis”, prossegue. Anualmente, surgem em Portugal 6000 novos casos de cancro da mama.
72% fizeram mamografia
Os dados da GFK indicam que 78% das mulheres realizam o auto-exame da mama. As participantes dizem estar bem informadas sobre a doença, recorrendo sobretudo aos médicos, mas também a fontes como a Internet. Quem não faz o auto-exame explica que não pensa no assunto, mas também há quem não ache necessário ou não o saiba fazer. A medida de eleição para as inquiridas é mesmo a mamografia, referida por 83% das mulheres, ainda que só 72% afirmem que já realizaram este exame.
Apesar de alguns trabalhos defenderem que nem sempre as mamografias ajudam ao diagnóstico, Paulo Cortes contrapõe que “há questões economicistas” por detrás destas recomendações. “A mamografia e a ecografia mamária ainda são os métodos de eleição para um diagnóstico precoce.” Mas sublinha que o exame, regra geral, só precisa de ser feito depois dos 40 anos e com uma periodicidade que deve ser avaliada caso a caso.
Quanto ao facto de as mulheres associarem o cancro da mama a factores hereditários, o médico alerta que quase nunca é assim: “A predisposição genética não ultrapassa os 10% a 15% dos casos. A esmagadora maioria dos casos não são de origem hereditária e têm que ver com outros factores, como a parte da alimentação e do sedentarismo.”
Uma parte do estudo fez perguntas mais concretas sobre os tratamentos. Os institutos portugueses de oncologia (IPO) surgem à cabeça como o local de eleição, seguidos pelos hospitais públicos em geral. Após um diagnóstico, as mulheres antevêem que o caminho em termos de tratamentos passe pela quimioterapia e a radioterapia, desconhecendo alguns dos fármacos inovadores que existem na área.
Paulo Cortes diz que é natural este desconhecimento, já que só após um diagnóstico concreto as pessoas procuram informação. “Os tratamentos clássicos ainda são os mais comuns, mas estamos cada vez mais a individualizar o tratamento”, assegura.
“Hoje em dia, e cada vez mais, nós tratamos do cancro da mama como uma quantidade de doenças que têm comportamentos muito diferentes”, explica o médico, acrescentando que é a análise biológica ao tumor que traça o melhor tratamento. “Tomamos decisões de tratamento quase em tempo real com análises ao sangue. Isto vai ser muito o futuro. Mas isso não quer dizer que o tratamento inovador seja o melhor para todas”, sintetiza.
O oncologista Paulo Cortes considera que o rastreio é fundamental para garantir que o diagnóstico dos novos casos de cancro da mama é precoce. Mas diz que questões burocráticas têm travado estas acções, tanto na zona de Lisboa como na de Setúbal. Há um ano, a Liga Portuguesa contra o Cancro fez chegar à Assembleia da República uma petição com 25.000 assinaturas, que pretendia precisamente alertar para as desigualdades no acesso ao rastreio, diagnóstico e tratamento do cancro da mama. Nas contas da Liga, na região centro todas as mulheres estavam rastreadas, no Norte a cobertura era superior a 80% e o grande problema mantinha-se a sul, com metade das mulheres de fora.
Romana Borja-Santos
Fonte: Público