Os acidentes vasculares cerebrais são a principal causa de morte em Portugal e os homens são mais afetados

 

O relógio não pára. Muitos não chegam a tempo. Tic-tac-tic-tac. O mundo gira e, a cada segundo que passa, uma pessoa sofre um AVC.

Tic-tac-tic-tac. A cada hora, um acidente vascular cerebral cruza-se, repentinamente, na vida de três portugueses. Tic-tac-tic-tac. É tarde demais para um deles que não sobrevive, juntando-se aos cinco milhões de doentes que, anualmente, a nível global, morrem devido a esta complicação, de acordo com dados da Organização Mundial de Saúde. Aqueles que escapam ficarão com sequelas incapacitantes.

 

Está, assim, traçado o retrato da principal causa de mortalidade e incapacidade no nosso país, resultados que colocam Portugal numa situação “equiparável à Europa de Leste” no combate a este défice neurológico súbito, como enquadra Luísa Fonseca, internista da Unidade de AVC do Centro Hospitalar Universitário de S. João, no Porto.

 

“É muito complicado, em termos de sequelas, quer para o próprio doente quer na estrutura familiar. A pessoa deixa de ter autonomia e passa a ser dependente de terceiros. Perdem, muitas vezes, a capacidade de marcha, de comunicação e deixam de conseguir alimentar-se, necessitando de sondas”, refere a profissional médica.

 

 “Portugal melhorou muito no tratamento da doença coronária, por exemplo, mas temos péssimas estatísticas no combate ao AVC”, frisa a especialista, ouvida pelo Vida Extra. “Há 20 anos não tínhamos praticamente nada e agora começamos a ter algumas hipóteses de tratar durante as primeiras horas, mas ainda há muitos doentes que não chegam a tempo”, complementa a investigadora do Núcleo de Estudos da Doença Vascular Cerebral da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna.

 

O risco, prossegue, “aumenta com a idade e os homens têm mais possibilidades do que as mulheres de sofrer um acidente vascular cerebral”, que pode ter duas tipologias. “O AVC isquémico ocorre quando há uma obstrução de uma artéria e o hemorrágico quando quando uma artéria rebenta dentro do cérebro”, explica Luísa Fonseca.

 

Se a origem é hemorrágica (com uma prevalência de 15%), “nada mais se pode fazer a não ser internar o paciente e atuar de acordo com as consequências”, mas quando a ocorrência é isquémica o tratamento passa por “administrar — até quatro horas e meia desde o início dos sintomas — um fármaco trombolítico que vai diluir o trombo e que pode, por si, desobstruir a artéria e melhorar o doente”, aclara a internista de 47 anos. É urgente agir rápido, para que o quadro clínico possa ser revertido. “Ainda tenho doentes que esperam um dia, em casa, à espera que passe. Essa espera pode ser trágica e fazer a diferença entre conseguir ou não melhorar”, afirma Luísa Fonseca.

 

A grande prevalência em Portugal pode ser justificada pelas tradições alimentares enraizadas na cultura nacional. “Comemos muito sal e temos uma população que ainda bebe bastante”, adverte a especialista, relativamente a uma doença onde a hipertensão arterial, o tabagismo, a dislipidemia e o consumo de álcool figuram como principais fatores de risco. Os sinais de alerta, elenca a médica, são os três F’s: face descaída, perda de força no braço ou na perna e diminuição da fala.

 

O AVC leva ao internamento de mais de 25 mil doentes por ano nas unidades hospitalares nacionais.

 

André Manuel Correia

 

In “Expresso”