Dizer-se que as autoridades validaram 135 casos de gripe em laboratório nesta época gripal não é o mesmo que afirmar só ocorreram estes casos de gripe na Madeira

Bruna Gouveia diz que este ano há uma maior monitorização da gripe. Por outro lado, em estimativa, o ano passado terá havido mais mortes devido ao “frio e à gripe” do que é conhecido.

 

Nesta época gripal, os madeirenses estão a enfrentar dois tipos de vírus influenza, ou da gripe. Um é do tipo B e o outro do tipo A. Dentro do vírus da gripe A, está em circulação na Região dois subtipos: o A (H1) pdm09 e o A (H3).

 

De acordo com os testes laboratoriais realizados, o primeiro vírus da gripe a ser detetado na Madeira nesta época gripal foi o do tipo B, mas conforme os dias foram passando o vírus da gripe A assumiu maior predominância. Nas últimas três sema- nas o vírus do tipo B ainda aumentou a sua presença, esbatendo um pouco a distância que mantinha da gripe A, mas, globalmente, nunca conseguiu se aproximar muito.

 

O último balanço do Instituto de Administração da Saúde (IASAÚDE), realizado sexta-feira, indicou que estão confirmados, laboratorialmente, 135 casos de gripe na Madeira, sendo 46 do tipo B e 89 do tipo A.

 

Dizer-se que as autoridades validaram 135 casos de gripe em laboratório nesta época gripal não é o mesmo que afirmar só ocorreram estes casos de gripe na Madeira, uma vez que nem todas as pessoas terão recorrido aos serviços de saúde, na presença dos sintomas. Estes foram  apenas os casos validados pelo laboratório.

 

As análises que têm sido realizadas na Madeira são depois compiladas e enviadas para o Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, que é quem, em Portugal, coordena o Sistema de Vigilância da Gripe (INSA). Este sistema é ativado na semana 40 e funciona até à semana 20 do ano seguinte, correspondendo ao período entre outubro e maio.

 

Durante estes meses, as regiões do país produzem os seus testes laboratoriais localmente e enviam-nos para o INSA, que depois traça o panorama nacional. Neste momento, a predominância do vírus da gripe em Portugal é do tipo B, embora na Madeira o domínio seja do tipo A.

 

Os vírus A [A (H1) pdm09 e o A (H3)] e B, que estão em circulação na Madeira, eram os esperados pelas autoridades de saúde, quando planearam a resposta para a atual época gripal, e são os mesmos que circulam no território continental português e, de um modo geral, no hemisfério norte, havendo predominância de um ou de outro, conforme os países ou regiões.

 

 

 

Mas o vírus da gripe A, que rapidamente associamos à gripe das aves, que causou uma pandemia em 2009, matando centenas de pessoas, não tem, contudo, o mesmo subtipo daquele que causou alarme internacional. Em 2009, surgiu um novo subtipo, o H1N1, com capacidade de infetar os seres humanos e contendo genes das variantes humana, aviária e suína do vírus da gripe, apresentando “uma combinação nunca antes observada em todo o Mundo”, de acordo com um documento sobre o tema, disponível no site da Universidade de Coimbra.

 

Porém, este subtipo não é igual aos subtipos A (H1) pdm09 e o A (H3) que os madeirenses enfrentam nesta época gripal.

 

Ainda assim, muitos madeirenses mantêm-se em alerta, até porque o balanço desta época gripal mostra que já morreram quatro pessoas e 40 foram internadas, oito das quais nos cuidados intensivos.

 

“O peso e importância que se dá agora à gripe A” estão relacionados com que sucedeu em 2009, admite Bruna Gouveia, vice-presidente do IASAÚDE. No entanto, ao contrário do que acorreu nessa altura, agora “nós não estamos a viver uma pandemia”, esclarece. Nem o subtipo é o mesmo.

 

Não obstante, as quatro mortes registadas este ano na Madeira foram todas devido à gripe A. Será o vírus A mais perigoso do que o B?

 

A vice-presidente do IASAÚDE explica que o vírus da gripe A tem capacidade para sofrer mais mutações do que a gripe B – e as defesas de base de cada pessoa são tanto maiores quanto menores forem as mutações -, mas Bruna Gouveia evita avaliar o seu grau de perigosidade.

 

Ainda assim, reconhece que a gripe A “está associada a situações com maior gravidade, especialmente em pessoas que têm outras patologias”. De facto, as quatro vítimas mortais tinham múltiplas patologias associadas.

 

Ao contrário do que muitos poderão pensar, o vírus do tipo A permanece em circulação na Madeira desde 2009, embora com uma intensidade flutuante ao longo dos anos. E, tal como na época gripal que estamos a viver, no ano passado o vírus predominante foi o do tipo A.

 

Então como se explica que nunca como agora se fale tanto da gripe A na Madeira?

 

Para Bruna Gouveia, há vários fatores que o explicam.

 

Além das mortes e internamentos noticiados, fala-se mais da gripe A do que nos outros anos porque este ano “a monitorização está a ser mais alargada”, o que permite ter “mais dados disponíveis”.

 

Além disso, o plano de contingência não foi acionado o ano passado. “Se uma pessoa fosse internada por gripe, não entrava neste processo de vigilância” que este ano o plano impõe, adianta.

 

Acresce que, agora, a Unidade de Cuidados Intensivos da Região passou a fazer parte da área de monitorização.

 

Também o número de análises laboratoriais aumentou. Na época 2006/2017, foram realizados 37 exames, dos quais 27 deram positivo resultando na predominância do subtipo A (H3).

 

As mudanças deste ano resultaram do “investimento na área da monitorização da gripe” que foi feito na Região.

 

“Mais monitorização implica ter mais dados”, continua, mas isso “não significa que a situação seja muito mais grave”. Apenas que “nós compreendemos mais a circunstância” ativando um plano de contingência que teve um efeito positivo, por exemplo, na resposta a “dar aos nossos utentes”. Daí resultou que “a resposta aumentou nos cuidados de saúde primários (os três centros de saúde associados: Machico, Santo António e Bom Jesus) e diminuiu nos cuidados de saúde diferenciados, nomeadamente nas Urgências”, explicou.

 

Bruna Gouveia explica, por outro lado, porque é que havendo a mesma predominância da gripe A tanto este ano como no ano passado, agora morreram quatro pessoas e não há notícias de mortes no ano passado.

 

Embora ainda não seja possível aferir se as mutações genéticas que o vírus sofreu do ano passado para este o tornaram mais perigoso – só no final da época os dados serão analisados- Bruna Gouveia sabe que “todos os anos morrerem pessoas devido à gripe”, ainda que “não exista uma estatística que permita ver qual é o número exato de pessoas que têm gripe e qual é o número exato de pessoas que morreram com consequência da gripe”.

 

“Como é que nós fazemos? O indicador que se utiliza para avaliar a mortalidade, é a mortalidade por todas as causas”, disse a nossa interlocutora. “Vamos ver todas as pessoas que morreram durante aquele período, entre a semana 40 e a semana 20 do ano seguinte (entre outubro e maio), e vamos ver, nesta mortalidade, qual o excesso de mortos”.

 

“Por exemplo, o ano passado, identificou-se que havia um excesso de mortos, durante a época gripal, de 27%, que era associado à gripe e ao frio, e isso implicaria uma estimativa, em Portugal, de 43 óbitos, por 100 mil habitantes”, disse Bruna Gouveia, acrescentando que, transpondo para a realidade madeirense, “se a nossa mortalidade fosse idêntica, considerando esta estimativa, teríamos à volta de 110” pessoas na Região que teriam morrido com “consequências da gripe e do frio”.

 

In “JM-Madeira”