Os portugueses estão a consumir menos açúcar nos refrigerantes, desde que entrou em vigor, em Fevereiro de 2017, a taxa sobre as bebidas açucaradas e os refrigerantes.

Mas não porque tenha havido uma grande quebra na compra dessas bebidas, revela um estudo de dois economistas da Nova School of Business & Economics, divulgado pelo Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério da Economia. A quebra no açúcar deveu-se, sobretudo, à reformulação das quantidades desta substância em algumas bebidas, com a indústria a evitar assim pagar o imposto mais elevado. A quebra mais visível no consumo deu-se, curiosamente, entre as bebidas menos açucaradas.

 

Os investigadores Judite Gonçalves e João Pereira dos Santos analisaram os dados “extremamente detalhados” de um dos dois maiores retalhistas do país, entre Fevereiro de 2015 e Janeiro de 2018, e chegaram a uma conclusão: “Os benefícios da taxa do açúcar em termos de redução do consumo do açúcar têm sobretudo a ver com a reformulação, uma vez que os produtores reduziram as quantidades de açúcar em algumas bebidas, para ficarem abaixo do limiar dos 80 gramas por litro”, referem. O imposto foi já este ano alterado, ganhando novos escalões, mas na primeira versão, que foi analisada neste estudo, ele significava uma taxa de 0,08 euros por litro, para bebidas com mais de 80 gramas de açúcar por litro (g/l), e de 0,16 euros para as que tivessem 80 g/l ou mais.

 

Para chegar às conclusões agora divulgadas, os dois economistas dividiram as bebidas açucaradas em quatro grupos – o primeiro com bebidas com mais de 80g/l; o segundo com bebidas exactamente abaixo desse limiar; o terceiro para todas as que estivessem abaixo dos 70g/l e o quarto para aquelas sem adição de açúcar. Em termos económicos, os resultados não são surpreendentes – os produtores fizeram reflectir os custos acrescidos decrescentes dos impostos no preço levado ao consumidor (e às vezes até acima disso, o que poderá estar relacionado com custos associados à reformulação do produto).

 

Também a reacção dos portugueses nos meses imediatamente anteriores à entrada em vigor da taxa pode ser encarada como normal, referem os autores do estudo, citando mesmo a corrida aos postos de combustível aquando da paralisação dos camionistas de matérias perigosas em Abril. Ou seja, os consumidores trataram de acumular refrigerantes antes da prevista subida de preços. Depois, tudo estabilizou. “Houve alguma quebra no consumo de refrigerantes, mas na maior parte dos casos, ela não foi significativa”, diz ao PÚBLICO Judite Gonçalves. Nas bebidas mais açucaradas, os investigadores apontam para uma quebra de 6% no consumo, mas eles mesmo referem que “a estimativa não é suficientemente precisa para ser estatisticamente significativa”. A quebra mais visível, de 18%, é nas bebidas menos açucaradas.

 

Um dado que pode parecer estranho, mas para o qual os autores do estudo apontam explicações. Por um lado, referem, há a hipótese de estas bebidas serem menos “aditivas” que as outras, levando a que o seu abandono seja mais fácil. Por outro, os consumidores deste tipo de bebidas podem ter tido uma maior percepção de que elas também fazem mal, levando a que as comprassem em menor quantidade. Os que consomem as bebidas com maior teor de açúcar, já sabiam que elas eram prejudiciais, pelo que não foi a discussão do tema nos meses que antecederam a entrada em vigor da nova taxa que levou a que deixassem de as comprar.

 

A bastonária da Ordem dos Nutricionistas, Alexandra Bento, salienta que este é mais um estudo que aponta para a importância deste imposto. “Se calhar foi das mais importantes medidas em termos de saúde pública a que assistimos nos últimos tempos”, disse ao PÚBLICO. A situação pode melhorar se a nova versão da taxa, com quatro escalões em vez de dois, levar a uma nova diminuição do açúcar nas fórmulas de algumas bebidas, refere.

 

Sal ainda à espera

 

À semelhança do que se passa com o açúcar, já houve tentativas para criar uma taxa para os produtos com mais elevado teor de sal. Mas, ao contrário do que se passou com açúcar, a medida acabou travada no parlamento. Alexandra Bento não tem dúvidas de que ela teria efeitos positivos ao nível da saúde dos portugueses. “O sucesso desta medida [a taxa sobre as bebidas açucaradas] assim o diz. Mas a contra-informação a que muitas vezes assistimos, a tentar velar o sucesso desta medida, pode fazer com que haja confusão e não se avance. É uma questão de percebermos o que é a evidência”, diz.

 

A Ordem dos Nutricionistas, garante, vai continuar a fazer chegar ao poder político a sua posição nesta matéria, com a bastonária a admitir que gostaria de a ver entrar em vigor na próxima legislatura. “Insistimos na necessidade de promover políticas na área da alimentação e nutrição, e este é um exemplo. Até auxiliamos ao seu desenho. Não nos podemos colocar de forma mais proactiva. Gostaria que se chegasse a essa taxa, mas que não se ficasse só pela taxa”, sublinha.

 

Tal como no caso da ingestão de açúcar, é necessário que os portugueses percebem as consequências do consumo excessivo de sal. “As medidas, quando são isoladas, não surtem o efeito devido. É preciso aumentar a literacia da população, é preciso haver mais medidas informativas. E se não tivermos nutricionistas em número suficiente e nos sítios certos não é fácil melhorarmos”, insiste.

 

Em 2017, na votação do Orçamento de Estado, uma proposta do executivo para que fosse aumentada a taxa sobre os alimentos com elevado teor de sal acabou chumbada, recebendo apenas os votos favoráveis do PS e do Bloco de Esquerda. Na mesma altura, uma proposta de alteração ao documento, apresentada pelo CDS, que previa a eliminação do Imposto sobre os Alimentos com Elevado Teor de Sal, foi aprovada, com o apoio do PCP.

 

Patrícia Carvalho

 

In “Público”